domingo, 24 de agosto de 2008

Trans-Sib #10 Olkhon (parte I)

As casas não são aquecidas, e nem mesmo o facto de serem todas em madeira as torna mais isoladas e quentes! Dormi no saco-cama e só não dormi dentro da cama para conseguir ter mais algumas camadas entre as tábuas e as minhas costas!
Passámos o dia todo fora! Escolhemos um dos programas do hostel e fomos até ao extremo norte da ilha, ao Cabo Koyboy.
E não poderíamos ter tido melhor meio de transporte do que o famoso 'pão de forma russo' (Буханка), o UAZ-452 Ulyanovsky Avtomobilny Zavod (Ульяновский Автомобильный Завод), construído por volta de 1961 (quero um para mim!). Uma viatura fantástica, que vai a todo o lado (é 4x4) e não há nada nem ninguém que o pare! Fiquei fã incondicional deste brinquedo (a juntar ao Lada Niva)....


Simplesmente fantástico... feio? Também o UMM o é e no entanto...

O percurso atravessa zonas arenosas, com pinheiros e abetos, até chegarmos ao Cabo Koyboy, a norte de Olkhon. Aqui falésias brutais em granito róseo mergulham num 'mar' azul a perder de vista. O vento soprava forte naquele dia, chamam-lhe o Sarma, que sopra do vale do rio com o mesmo nome e que desagua no Maloye Morye (pequeno mar). A vista a partir do cabo é brutal, a norte não se avista terra e parece que estamos frente a um oceano!


"As águas do Baikal vinham abraçar a areia em vagas suaves; o lago era manso e na superfície escura viam-se pontinhos brilhantes, pareciam diamantes a reflectir o cintilar do Sol no repúsculo. Filipe tirou os sapatos e calcorreou a berma, chapinhando na água."
(in O Sétimo Selo - José Rodrigues dos Santos)


"Amanhecia no Baikal e os primeiros raios da aurora despontavam do outro lado de Olkhon, recortando a sombra negra e longa da ilha no anil escuro do firmamento. Olharam em redor e viram pela primeira vez o cenário da costa onde tinham ido encalhar; rodeava-os a estepe, com a taiga e as montanhas a crescerem lá adiante, a costa rasgada em sucessivas enseadas, baías e cabos, aqui línguas de praia, ali penhascos escarpados."
(in O Sétimo Selo - José Rodrigues dos Santos)


Parece que estamos numa costa oceânica!


O Cabo Koyboy ao fundo e depois só 'mar'...

A ilha de Olkhon é um dos cinco importantes pontos do shamanismo e durante o percurso encontramos vários postes shamãs. A tradição dita que os espíritos devem ser honrados com faixas de tecido colorido e oferendas que são colocadas nestes postes localizados em locais específicos! No Cabo Koyboy existe também um destes postes e está rodeado de pequenas pirâmides feitas de pedras sobrepostas que fazem lembrar as stupas (encontrei semelhantes construções na Noruega!).



Quatro postes shamans no meio da ilha; e no Cabo Koyboy; Pormenor do poste no Koyboy; as 'stupas' de pedra

Parámos para um pic-nic típico, sopa de peixe com batata (omul, claro!), salada de pepino e tomate e pão, sem esquecer os tais bolos (desta vez sem sabor a pastilhas Pirata) e chá que acompanha todas as refeições destas gentes!
Regressamos a Khuzir no final da tarde, depois de mais umas voltas por entre florestas de pinheiros que fazem lembrar a nossa costa vicentina! Aproveitamos o tempo que ainda nos separa do jantar para procurar um cibercafé... azar, por aqui o acesso é feito a partir de satélites e somos informados pelo rapaz que nos recebe que o "sputnik kaput"! Optamos por ir ver as famosas pedras shamans que se encontram mesmo ali ao lado...



"Não é uma pedra xamane", corrigiu o amigo. "É a Pedra Xamane." Sublinhou o 'a pedra'. "Este rochedo é um dos nove locais mais sagrados da Ásia."
(in O Sétimo Selo - José Rodrigues dos Santos)

Decidimos dar mais uma volta até ao porto de pesca e somos presenteados com mais um magnífico pôr-do-sol no Baikal!


O porto de pesca de Khuzhir



"O Sol deitava-se devagar por detrás dos montes, à esquerda, pintando o poente de um violeta luminoso; mas o fim de tarde em Olkhon assumia sobretudo o frio tom do azul-acinzentado, obscurecendo as montanhas nevadas e a taiga para lá de Maloye Morye, o estreito que separa a ilha da costa continental que cerca o Baikal."
(in O Sétimo Selo - José Rodrigues dos Santos)

O jantar é uma surpresa! Hamburguer com puré de batata, mas desenganem-se se pensam que são feitos a partir de carne suculenta! É que são mesmo de peixe... novamente o omul!
São quase 22H00 e por estes lados, e a esta hora, todos estão em casa, pois o frio siberiano é mesmo frio, mesmo no verão! Amanhã espera-nos uma nova viagem de 7 horas de regresso a Irkutsk e comboio para Ulaanbaatar, na Mongólia (1 dia e meio de viagem).