sexta-feira, 19 de setembro de 2008

O Sétimo Selo (parte I)

Não resisti a reler o livro do José Rodrigues dos Santos, O Sétimo Selo, que tem vários capítulos passados na Rússia, e em particular na ilha de Olkhon! E porque gostei imenso do livro (que devorei entusiasticamente) não resisti à tentação de ilustrar certas passagens com imagens que fui recolhendo durante a viagem...
Obrigado Zé!

XIII
Contornaram as grandes muralhas fronteiras à rua até o espaço se abrir numa enorme praça que Tomás instantaneamente reconheceu das fotografias.



"Esta é a Krasnaya Ploschad", anunciou Nadezhda.
"Oh", exclamou ele, surpreendido. "Julguei que era a Praça Vermelha."
A russa olhou-o com ar trocista.
"E é", exclamou. "A Krasnaya Ploschad é a Praça Vermelha."
"Ah, bem me parecia. Mas porque lhe chamam ainda Praça Vermelha? Se o comunismo já acabou, não seria lógico mu-darem-lhe o nome?"
"O nome não tem nada a ver com o comunismo."
"Não tem? Esta é a Praça Vermelha e, que eu saiba, a cor do comunismo é o
vermelho."
"É uma coincidência, Tomik", explicou ela. "A praça cha-ma-se Krasnaya Ploschad desde o tempo dos czares. Krasnaya vem de krasnyy, uma palavra que originalmente significava bonito e que passou a querer dizer vermelho."



Os olhos de Tomás ficaram presos ao majestoso monumento que se erguia do outro lado da praça, exactamente como as inúmeras fotografias o mostravam. Era um edifício grandioso, dominado por belas torres com cúpulas em forma de bolbo, pintadas de várias cores; parecia um palácio das mil e uma noites, um brinquedo em tamanho gigante. Não havia engano possível, era aquele o ex-líbris de Moscovo.
"Caramba", exclamou, quase embevecido pela magnificência da arquitectura de conto de fadas. "O Kremlin."
Nadezhda soltou uma gargalhada.
"Não, Tomik. Aquilo não é o Kremlin."
"Como?"
"É a Catedral de São Basílio."



"Mas... mas sempre ouvi dizer que aquilo era o Kremlin..."
"Todos os turistas fazem confusão, deixa estar." Apontou para as muralhas à direita, que tinham contornado desde que saíram do metro. "Isto é que é o Kremlin."



Tomás observou as muralhas cor de tijolo, primeiro surpreendido, depois desconfiado.
"O Nadia, estás-me a pregar uma peta."
"Juro que isto é o Kremlin." Apontou para uma estrutura diante das muralhas.
"Ali à frente, estás a ver? Aquilo é o Mausoléu de Lenine, para onde ia o Estaline, o Brejnev e toda essa gente quando havia grandes marchas militares aqui na Praça Vermelha. Atrás das muralhas é que está o Kremlin."
"Não pode ser."
"A sério. Kremlin vem de kreml, que quer dizer fortaleza. Estas são as muralhas da fortaleza que o czar mandou construir aqui." Indicou os edifícios para além das muralhas. "O Kremlin é um complexo administrativo que inclui palacetes, jardins e até igrejas." Apontou para umas cúpulas douradas que reluziam à distância.
"Estás a ver aquilo? São as cúpulas da Catedral da Assunção, construída exactamente no meio do complexo."
Desiludido, Tomás já não quis visitar o Kremlin. Preferiu arrastar a mala até junto da espectacular Catedral de São Basílio, que sempre confundira com o Kremlin, e ficou a contemplá-la, maravilhado.



Para ele, o Kremlin seria sempre aquele belíssimo monumento, dissessem o que dissessem. Percorreram as capelas do interior uma a uma, mas os encantos da catedral não lograram iludir-lhes a fome.
Perto das três da tarde, já cansados e com alguma fraqueza, deram a visita por concluída e decidiram fugir para outro lado.